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É possível viver apenas das florestas nativas brasileiras?

Você já se perguntou de onde vem o papel? Ou o móvel onde você provavelmente está apoiando o computador para ler este artigo? Ou mesmo a estrutura do seu sofá, do seu colchão? Neste artigo vou contar de onde vem tudo isso e o porquê, por enquanto, também precisamos das florestas plantadas.


Já aprendemos sobre a importância da conservação das florestas nativas, graças a um processo longo de educação ambiental, que nos acompanha desde o ensino fundamental, seja na escola ou pelos meios de comunicação. Porém, ainda vejo algumas objeções quanto às florestas plantadas. Como (quase) engenheira florestal, depois de tantos anos de estudos relacionados ao meio-ambiente e ao papel eco-sócio-econômico das florestas nativas e plantadas, sinto que tenho um compromisso em também conscientizar a respeito do setor florestal e quebrar alguns mitos que a sociedade possui com relação ao mesmo.


Gostaria de esclarecer que não estou de maneira nenhuma menosprezando as florestas nativas e toda a sua biodiversidade. Devemos cada vez mais proteger nossas florestas, sim, mas não devemos achar que as plantações florestais são as vilãs da natureza, muito pelo contrário, pois sem elas talvez a quantidade de florestas naturais que teríamos seria imensamente menor. É importante não sermos extremistas a ponto de pensar que os plantios florestais são de todo ruim, assim como não podemos ser ingênuos de imaginar que conseguiríamos manter nosso modo de vida atual apenas com as florestas nativas.


As plantações florestais


As duas principais espécies plantadas atualmente são exóticas, ou seja, nativas de outras regiões fora do Brasil. São elas o Pinus e o Eucalipto, o primeiro mais comum na região Sul do país e o segundo mais distribuído no território brasileiro. Se essas são as duas espécies mais plantadas é porque tem um motivo, sendo o principal a sua alta produtividade, tanto no quesito de crescimento quanto no de rendimento. Isso quer dizer que, considerando estes pontos mencionados, vale mais a pena, financeiramente e ambientalmente, utilizar essas espécies do que a maioria das espécies nativas. Atualmente, outras espécies tanto exóticas quanto nativas, como a Andiroba, o Mogno e o Paricá, e outras exóticas, como a Teca são plantadas, mas em proporções bem menores do que o Eucalipto e o Pinus.


A importância da madeira na nossa vida


A madeira é um material que sempre esteve ligado à evolução da sociedade, podemos lembrar da descoberta do fogo e da lenha, dos navios feitos de madeira que chegaram até o Brasil e desbravaram o mundo até o uso da madeira nos dias de hoje. De acordo com a Associação Paranaense de Empresas de Base Florestal (Apre), o uso da madeira auxilia no aumento da qualidade de vida, pois a madeira é matéria-prima de diversos setores, tais como de medicamentos, cosméticos, a indústria têxtil, o próprio setor de educação, entre outros. A Indústria Brasileira de Árvores (IBÁ) diz que conseguimos produzir 5 mil produtos e subprodutos oriundos da madeira. Incrível, né?


O setor florestal


Plantar florestas foi uma alternativa ao consumo da madeira de florestas nativas que mais deu certo até o momento. Yeda, Edilson e Moacir e a Associação Baiana das Empresas de Base Florestal (ABAF) mostram que há florestas apenas em áreas que já perderam suas características que permitiriam a realização de agricultura ou pecuária no local. As áreas dos plantios florestais geralmente são em locais que já foram exauridos por outras atividades, que possuem relevo mais acidentado e solos mais pobres e degradados. A solução que se encontrou para o uso dessas áreas que perderam sua aptidão agrícola foi o plantio de árvores para produção madeireira. Ou seja, nenhuma floresta nativa é desmatada para que o plantio de árvores para fins comerciais ocorra.


Outra coisa interessante sobre o setor é que ele, além de reduzir a pressão, também conserva áreas nativas. Essas áreas protegidas são estabelecidas por lei a partir de áreas de Reserva Legal (RL) e Áreas de Preservação Permanente (APP). As empresas do setor florestal muitas vezes vão além desses requisitos legais e investem também na criação de Reservas Particulares de Patrimônio Natural (RPPN) e Áreas de Alto Valor de Conservação. A Klabin, maior produtora de papel do país, por exemplo, possui um parque ecológico dedicado a proteger, cuidar e resgatar espécies ameaçadas de extinção, além de usá-lo como uma área para educação ambiental.


Para cada 1 hectare plantado no Brasil, 0,5 hectares de floresta nativa são preservados. Ainda não é uma situação ideal, porém, isso já é um bom indicador que mostra a preocupação das empresas quanto à conservação da natureza, dos recursos hídricos e da manutenção da biodiversidade. Algo que grande parte das empresas do setor fazem também é aderir a um sistema de certificação dos seus produtos. Quem nunca viu aquele selo do FSC quando comprava papel? Apesar de seu caráter voluntário, as empresas reconhecem a importância de certificar e garantir que seus processos são corretos social e ambientalmente.


A principal função das florestas plantadas para fins comerciais é a produção de bens e serviços que auxiliam no desenvolvimento da sociedade. Ao produzir esses bens e serviços, antes feitos a partir de florestas nativas, as florestas plantadas ajudam a reduzir a pressão sobre as florestas nativas. Isso ocorre justamente pois o que antes era feito a partir de florestas nativas passa agora a ser elaborado a partir das florestas plantadas, que são implementadas justamente para suprir essa demanda, poupando assim as florestas nativas de serem exploradas. Isso fica nítido quando olhamos o gráfico abaixo, gerado pelo IBGE, onde vemos que o uso de produtos advindos de florestas plantadas foi crescendo, até se tornar majoritário e hoje representa 80% do consumo de madeira no país.




Plantações florestais e as mudanças climáticas


Outra função que estas florestas possuem está estritamente ligada à mitigação e adaptação às mudanças climáticas. Elas auxiliam na mitigação por conta de que a partir de seu uso evitamos a abertura de novas áreas para a produção de produtos derivados da madeira, além de ter um grande papel na remoção de gás carbônico da atmosfera através da fotossíntese e armazenamento desse carbono na madeira, impedindo que ele volte à atmosfera. No que diz respeito ao processo de adaptação, as florestas plantadas permitem a produção de diversos produtos que atendem variados setores, se mostrando como uma alternativa aos métodos tradicionais de produção e sendo a base da nova economia por produzir a partir de fontes renováveis.


Fluxo hídrico e conservação do solo


Apesar de muitas vezes serem intituladas de deserto verde ou de secadoras de solo, as florestas plantadas possuem papel importante dentro do fluxo hídrico, na conservação do solo e na manutenção da biodiversidade. Uma parte da água é absorvida pelas folhas das árvores, fazendo com que chegue menos água diretamente no solo, reduzindo o impacto das gotas e também a formação de sedimentos facilmente transportáveis. Quando os sedimentos ficam mais difíceis de serem transportados eles têm menos chances de acabarem em um rio, por exemplo. Isso faz com que a presença das florestas plantadas reduza a quantidade de sedimentos que chega aos rios, mantendo a qualidade de água na região.


Por ter um rápido crescimento, o eucalipto faz mais fotossíntese e, consequentemente, consome mais água e gás carbônico para realizar esse processo. Ainda assim, o eucalipto, quando comparado a outras espécies agrícolas, consome muito menos água e nutrientes

do solo. Só que não vemos o impacto das culturas agrícolas, pois muitas vezes elas são irrigadas e consomem a água provida pela irrigação. Hoje em dia conhecemos o comportamento do eucalipto com relação a água e os impactos negativos causados pelo plantio de uma espécie de eucalipto que consome muita água em locais em que há pouca chuva, por exemplo. É por conta disso que os plantios devem ser muito bem planejados e ter o acompanhamento de profissionais responsáveis, principalmente no momento de escolher a espécie que será plantada, para que não ocorram esses problemas.


Qualquer espécie que cresça rapidamente vai precisar de muita água e gás carbônico para crescer. Hoje em dia, existem inclusive plantios de espécies nativas, como a Andiroba e o Paricá. Aqui eu levanto um questionamento que eu tive durante a escrita deste artigo. Aqueles que rotulam o plantio de eucalipto como deserto verde também o fariam se vissem um plantio de espécies nativas?


São realmente desertos verdes?


Por mais que não pareça, grande parte dos plantios florestais são realizados em mosaicos. Isso quer dizer que existem áreas preservadas, na forma de APP e RL, entre áreas com floresta plantada. Esses mosaicos auxiliam nas questões citadas acima e também servem de corredores ecológicos para a fauna da região.


Para ilustrar isso, visitei plantios de Pinus ao redor da minha cidade e um pequeno plantio de Eucalipto. Pude fazer alguns registros que mostram que há regeneração natural por conta da sombra formada pelas árvores plantadas e devido ao solo estar mais estruturado e menos degradado do que em áreas abertas (vídeo). Além disso, aos que possuírem a audição mais aguçada, perceberão ao fundo o barulho de animais neste vídeo. Claro que esse é um recorte da realidade na minha região, não posso afirmar que o mesmo ocorra em outros estados do país.






E então, conseguimos viver só de florestas nativas?


Até o momento, as plantações florestais parecem ser a melhor alternativa para produzir bens e serviços madeireiros e não-madeireiros e reduzir a pressão sobre as florestas nativas, pois produzem 90% da madeira para fins industriais do país ocupando apenas 2% da área nacional. Já imaginou se todos os derivados da madeira que consumimos viessem de madeira nativa?


Vale ressaltar que estas florestas são plantadas de maneira comercial, ou seja, o objetivo final é a sua retirada para produção de bens e serviços que auxiliam no desenvolvimento da sociedade. Não se tratando de uma floresta onde o objetivo principal é a conservação da diversidade, é importante entendermos isso para compreender que a floresta plantada cumpre, e muito bem, seu papel na provisão de bens e serviços e que, apesar de não se tratar do objetivo principal, ainda auxilia nos processos ambientais, ainda que, obviamente, de maneira menos expressiva do que florestas nativas fazem.


Depois de tudo isso, a minha resposta para a pergunta feita no título é “não, por enquanto, ainda não podemos viver somente das florestas nativas”. Assim como reconhecemos a importância das florestas nativas, também precisamos reconhecer o importante papel dos plantios florestais para um mundo mais sustentável. Claro que talvez não seja a melhor das opções, mas convido à reflexão de que tipos de alternativas poderíamos ter à monocultura de árvores, mantendo a mesma produtividade e rendimento, para os padrões atuais de consumo.


SOBRE A AUTORA:


Milena Pereira Kozlowski


Graduanda de Engenharia Florestal na Universidade Federal do Paraná com especialização na École Supéreure du Bois. Sou apaixonada por conhecimento e florestas e acredito que podemos ter uma vida mais equilibrada ainda assim valorizando nossos recursos florestais. Atualmente sou voluntária em uma pesquisa sobre o que pensa a comunidade da minha universidade sobre as mudanças climáticas.



As referências e opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do/a autor(a).

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